"[...] em certo momento, minha imaginação estacionou no quintal do jardim da casa onde morava quando criança. Sempre uma garota introspectiva, mesmo não tendo problemas sociais devido a isso, minhas melhores amigas de infância foram as árvores de meu quintal. Passava as tardes subindo nelas, brincando com suas folhas e flores, estando bem familiarizada com seus galhos e marcas em seus troncos. Conhecia intimamente a todas, tendo, inclusive, plantado ou ajudado a plantar algumas. Essa lembrança de infância me causa grande pesar, pois, há cerca de 2 anos, passei em frente a essa casa, subi no muro para matar a saudade de minhas velhas amigas e tive uma forte surpresa desagradável: elas haviam sido assassinadas pelo novo dono da casa. Nem a grama sob seus pés havia sido poupada. O quintal de minha infância, outrora cheio de vida, havia virado um grande terreno vazio, contendo apenas terra e lembranças. Essa imagem até hoje me causa lágrimas ao travesseiro. Não pude me despedir de minhas amigas antes do holocausto que as encontrou. Nunca pude dizer a elas do amor que sinto, da pessoa que me tornei, da reverência que sinto à natureza, muito devido à amizade paciente e estável delas.
Após isso, recordei-me das manhãs de aula, das idas à escola com meu pai. Nossas manhãs tão ritualísticas de café e caminhada, com o sol nos olhos. Mantenho uma boa relação com meu pai até hoje, cinco anos depois da separação de meus pais. Continuamos com nossos encontros ritualísticos de café e caminhada, apenas mudando o horário da manhã para a tarde."